sábado, 23 de maio de 2009

Elogie a Casa

Todos sabem a força de um elogio: à beleza, ao desempenho de qualquer atividade, à apreciação de um bem, à inteligência. Se você quiser agradar a alguém que acabou de fazer um discurso ou dar uma aula, seja o primeiro a chegar a ele e dizer que ele foi magnífico, brilhante. Só quem passou por situações de receber o elogio pode dizer da importância que uma apreciação desse tipo consegue. Nada mais triste, para quem fala, do que descer de uma tribuna sem receber palmas ou elogios. O mesmo se dá com os professores que dão aulas ou fazem conferência e depois não ouvem nada sobre elas. Há situações em que elogios específicos são importantes. As mulheres se encantam quando se diz que elas são bonitas. Outras esperam e contentam-se com elogios ao cabelo: como está bonito, que brilho, que corte, quem cuida de seu cabelo?
O elogio ao vestido serve também, principalmente quando caro. E assim por diante.
O criador de cavalos de raça espera o reconhecimento de seu belo animal. O de gado em exposição, então, nem se fala: os criadores que expõem nessas ocasiões são de uma vaidade doentia, porque lá se reúnem iguais, possuidores também dos melhores exemplares das melhores raças, e são todos vaidosos, extremamente vaidosos. Mas chega. Qualquer um pode fazer uma relação infinita de situações que servem para exemplificação da matéria.
Vamos falar, então, de um tipo de vaidade especial, começando por referências a pessoas importantes. O relato está num dos contos de Guy de Maupassant. Narra ele que um amigo seu foi, em companhia de um amigo, à casa de Émile Zola, quando este estava no auge da glória e da fama. O motivo da visita era um proposta levada pelo amigo do amigo sobre uma transação editorial envolvendo uma das obras do grande escritor. Este, vestido em seu roupão elegante, sentado à sua mesa, ouviu em silêncio a proposta do visitante e, depois de concluída a mensagem, respondeu categórico mas delicadamente: -“não, a proposta não me interessa.” Foi uma decepção para os visitantes, principalmente para o interessado no assunto. Mas traçando a estratégia da retirada, o que não era interessado no caso comentou: -“ mestre, que linda casa o senhor tem...” E, fora a proposta que não foi aceita, tudo o mais mudou. Derreteu-se o gelo, porque o semblante do escritor iluminou-se, e ele se pôs a falar da casa ( uma bela mansão no meio de árvores e flores, um verdadeiro castelo, com todos os requintes de bom gosto, capaz de causar orgulho ou inveja a qualquer barão ou senhor feudal da idade média. E forneceu detalhes da compra do sítio, da planta da casa, da construção, do significado de cada coisa. E isto aconteceu com um homem cercado de reconhecimento intelectual pelo mundo inteiro, romancista de valor e combativo defensor dos direitos do homem. Mas que era humano, e, portanto, alvo também da vaidade.
Eu tive uma casa à beira-mar, num condomínio fechado, perto de Salvador. A casa foi construída por mim, só não fiz carregar tijolos com minhas mãos. Mas surgiu de acordo com os meus desejos. Era uma bela casa, rústica mas atraente, típica casa de veraneio, destaque para os padrões da época em que foi construída (1972-1973). E, claro, era muito visitada. E todas as pessoas que chegavam lá iam logo observando a casa, o coqueiral, o mar, e diziam-se encantados com o lugar, aliás, com o paraíso: “isto aqui é um paraíso” . (Paraíso era a palavra que todos usavam para qualificar aquilo que deveria ser um refúgio mas terminou sendo um clubinho de gente até que eu nunca vira.)
Eu e minha mulher ficávamos lisonjeados, é claro, pois gostávamos daqueles elogios tão constantes e iguais.
Por que será que tantos ( os que podem ) fazem casarões que parecem castelos, mansões suntuosas, cheias de quartos e banheiros, de salões e de varandas, com piscina e quadras de tênis? Vaidade.
Por que outros são donos de carros caríssimos, raros, restritos a poucos privilegiados? Vaidade. Por que os preços altíssimos com que se arrematam cavalos de raça em leilões? Vaidade. Por que as mulheres usam jóias caríssimas, que não servem sequer para destacar-lhes a beleza? Vaidade. Assim, “A vaidade é de todo o mundo, de todo o tempo, de todas as profissões, e de todos os estados”, como disse o nosso grande e pouco conhecido filósofo Mathias Aires.
E continua valendo o ensino do Eclesiastes: “vanitas vanitatum, et omnia vanitas”.


Salvador, 25 de novembro de 2008
Oliveiros Guanais

Um comentário:

  1. Tio Oliveiros,
    Desculpe, mas é impossível não dizer que o texto é magnífico! Estou adorando o blog. Brilhante é pouco. Você é o nosso cara!
    O elogio é um tema fantástico. Talvez o tipo mais arrebatador seja o relacionado aos filhos. Se houver uma fumaça de lógica então, é covardia.O siri está na lata!Ou seria uma coruja?
    Um Chico Bajulador

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